LEMBRE-SE:
Quando empregar
CRASE (III)
Vamos ao nosso terceiro verbete sobre o emprego do acento grave indicativo de crase.
Você já deve ter observado construções como estas:
“Esse cantor é incrível, ele canta à Pavarotti!”
“Por seu estilo neste conto, dá para afirmar que você escreve à Luís Fernando Veríssimo.”
“É uma festa de época, todos estão vestidos à 1950, no estilo pós-Segunda Guerra.”
“Ele sempre foi muito excêntrico com esses sapatos à Luís XV. Não tem quem não repare!”
Em todos esses casos, observa-se a elipse da palavra “moda” ou “maneira”. Subentende-se uma destas locuções:
à moda de, à maneira de, ou, ainda, à semelhança de.
Você também já deve ter observado o emprego do acento grave sobre o a que inicia locuções adverbiais de instrumento/meio e de modo. Todavia, nesse caso, não se trata do acento indicador de crase, mas do acento analógico, usado por força da tradição linguística. Para ilustrar, veja estes exemplos:
“Andar à toa. Atirar à queima-roupa. Barco à vela. Carro à gasolina. Escrever à mão (à tinta, à máquina). Forno à eletricidade. Matar à bala. Pagamento à vista. Trancar à chave.”
Nesses casos, aquela regra prática que mencionamos no primeiro verbete, de trocar a palavra feminina por uma masculina e usar ao, não funciona. Veja:
“Andar à toa/Andar a pé. Atirar à queima-roupa/Atirar a esmo. Barco à vela/Barco a motor. Carro à gasolina/Carro a álcool. Escrever à mão/Escrever a lápis. Forno à eletricidade/Forno a carvão. Matar à bala/Matar a bordo. Pagamento à vista/Pagamento a prazo (e não “ao prazo”).Trancar à chave./Trancar a cadeado.”
Observe que pé, esmo, motor, álcool, lápis, carvão, bordo, prazo, cadeado são todas palavras masculinas.
Devemos salientar que há quem considere facultativo o emprego do acento indicador de crase em casos como barco à vela ou carro à gasolina. Segundo os autores que defendem essa hipótese, por não haver ambiguidade, o acento não é obrigatório. Só para lembrar, a ambiguidade ocorre em expressões como estas: lavar à mão (= usar a mão para lavar algo)/lavar a mão (= lavar a parte do corpo); pagar à prestação (= parcelar o pagamento)/pagar a prestação (= pagar a mensalidade). Nesses casos, o acento é necessário.
Outro caso para se observar é que, antes dos pronomes relativos que, qual e quais, ocorrerá crase sempre que o a ou as puder ser substituído por ao e aos.
“Aquela é a obra à qual você se referiu em sua palestra de ontem.”
“Aquele é o livro ao qual você se referiu na palestra de ontem.”
“Estas são amostras semelhantes às que foram encontradas na cena do crime.”
“Estes são materiais semelhantes aos que foram encontrados na cena do crime.”
Vejamos agora duas situações em que NÃO ocorre a crase:
1) Diante de palavra masculina
“Estas roupas estão cheirando a suor. Tenho que lavá-las quanto antes.”
“Quando estão na fazenda, eles não abrem mão de andar a cavalo o tempo todo.”
Cabe aqui destacar uma exceção. Como vimos acima, se estiver implícita a ideia de “à moda de”, “à maneira de”, usa-se o acento grave. Este também deve ser usado quando estiver subentendida a ideia de empresa ou de um objeto feminino.
“A visita à Ericsson será amanhã, às dez.”
“Iremos à Melhoramentos para ver os novos lançamentos de livros didáticos.”
“O Almirante estava se referindo à Niterói, a primeira de uma série de seis fragatas que foram adquiridas pela Marinha do Brasil a partir de 1976.”
2) Diante de nomes de cidades
“Chegaremos a Recife ainda nesta semana.”
“Gostei tanto que voltarei a Paris pelo menos mais umas duas vezes, para conhecer melhor a cidade.”
Somente se empregará o acento grave caso seja atribuída uma qualidade a essa cidade.
“Finalmente, depois de tanto tempo, voltarei à Recife da minha infância, onde passei os melhores dias de minha vida.”
“Mal posso esperar para chegar à Paris das grandes casas de alta-costura, da alta moda.”
Encerramos, aqui, mais um verbete sobre crase. O tema é extenso e ainda vai ser objeto de nossa análise. Até a próxima!