No verbete anterior sobre verbos defectivos, vimos que eles se dividem em três grupos e abordamos um verbo paradigmático do primeiro grupo: extorquir. Hoje veremos casos dos outros dois grupos.
O primeiro deles é o dos verbos que, depois do radical, têm sempre a vogal i. Um caso exemplar é o do verbo falir. No presente do indicativo, conjugamos apenas a 1.a e a 2.a pessoas do plural (nós falimos – vós falis). Como esse verbo não é conjugado na 1.a pessoa do singular do presente do indicativo, não há presente do subjuntivo (como vimos, esse tempo verbal origina-se da forma conjugada na 1.a pessoa do singulardo presente do indicativo). Também não existe imperativo negativo. Ele apresenta apenas a 2.a pessoa do plural do imperativo afirmativo(fali vós). Nos demais tempos, no indicativo e no subjuntivo, conjuga-se falir em todas as pessoas. Seguem a mesma conjugação verbos como aguerrir, combalir e florir.
Um caso especial que vale a pena abordar é o do verbo reaver, que tem conjugação semelhante ao verbo falir, ou seja, no presente do indicativo, é conjugado apenas na 1.a e 2.a pessoas do plural (nós reavemos - vós reaveis). Assim, também não hápresente do subjuntivo nem imperativo negativo. Ele apresenta apenas a 2.a pessoa do plural do imperativo afirmativo(reavei vós). Esse é o mesmo paradigma de conjugação de um outro verbo do segundo grupo: precaver.
O verbo doer é também um caso bem curioso: é conjugado apenas na 3.a pessoa do singular e do plural em todos os tempos e pessoas do indicativo e do subjuntivo. Não há imperativo afirmativo nem negativo. Observe que admitir a conjugação desse verbo na 3.a pessoa do singular e do plural do presente do subjuntivoé bem “esdrúxulo”, pois esse tempo verbal, nunca é demais lembrar e relembrar, deriva da 1.a pessoa do singulardo presente do indicativo, forma inexistente para esse verbo.
Vale observar:
Verbos que expressam fenômenos meteorológicos, como chover, ventar ou trovejar, não são defectivos, pois, em sentido figurado, podem ser conjugados em todas as pessoas.
Verbos que designam vozes de animais (latir, miar, cacarejar, balir) são conjugados apenas nas 3.as pessoas do singular e do plural.
Verbos impessoais (haver, no sentido de “existir”, fazer, ser e estar, quando indicam tempo) são conjugados apenas na 3.a pessoa do singular.
Cabe aqui uma observação importante: lista de verbos defectivos não é “cláusula pétrea”, ou seja, não se trata de uma relação de verbos que sempre serão desprovidos de algumas pessoas e tempos verbais. Cumpre ressaltar que a língua é um organismo vivo, sempre criado e recriado por seus falantes/usuários. Desse modo, não soa disparatado afirmar que este verbete tem, sim, prazo de validade. Para se ter uma ideia do quão relativo é o conceito de defectividade, podemos lembrar que verbos como adequar, explodir, acontecer e poder já foram considerados defectivos, por questões de forma ou de conteúdo (por exemplo, dizia-se que poder não deveriaser conjugado no imperativo porque, em virtude de seu significado, não faria sentido conjugá-lo nesse modo). Embora algumas gramáticas e dicionários mais tradicionais ainda classifiquem certos verbos como defectivos, a grande maioria das novas obras aceita a conjugação de tais verbos em todos as pessoas, tempos e modos.